Pensamento, crítica e criação em galego-português
Luís Maçãs
-SHELLEY, Defesa da poesia-
Amanhã talvez seja o dia da mudança de rumo; uma mudança imperceptível por fora. Assim é no universo da ficção.
Mas essa mudança não terá frutos -poderão dizer os mesquinhos-. É que tudo deve ser enveredado polo caminho da produção material? Quanta vileza se expande polo mundo, mentres os homens dançam com os olhos fechados e as mãos quentes, apalpando o vazio na procura dum objecto produtivo sem importar a sua alma e origem.
Adormecei, se é possível. Bom adormecei e não fagais os passos em volta, porque batereis contra a rocha do capitalismo mais cruel.
E chamareis-me louco, doido... E talvez isso não importe, porque estarei em outro tempo, viajando -fugindo- para mais não voltar. O silêncio me convoca e a maré beija-me na frente, como a mãe beija o seu filho enfermo, o seu filho doido.
Falarei-te minha amada; se acaso a distância, ou muito perto, no tempo em que o silêncio há-se verter nas mãos e as lágrimas esvarem pola face. Beijarás-me nos lábios meu amor e serei um herói vencido. Preciso o teu corpo húmido e quente, que me fai lembrar a casa da infância, que me fai lembrar o sorriso eterno do desejo.
Ler, imergir no desassossego dum poeta lânguido, o seu olhar inclinado, em cima do papel branco, a ilha da praia infinda. Tentar descrever todo o pensamento exprimido desde a crueldade, a hiperconsciência perante a morte. Preencher páginas e páginas com a voz emprestada por um autor sem nome, a história da humanidade manifesta nas palavras, parágrafos e páginas dos livros inacabáveis da Biblioteca de Babel.
E se descobrimos que esse desassossego é universal?... Fecharemos os olhos, tentando ser felizes em meio duma tragédia, apelando à nossa especial magia individual (-ista). Ou, talvez, mergulhando na lama espessa da mediocridade, podendo apenas falar dos traços distintivos dum sentimento perto da loucura, expresso com um canto cheio da beleza das palavras escuras.
E sendo impossível trespassarmos o muro que diante dos olhos se nos apresenta, educados pola geometria das palavras e tendo a crueldade duma mulher sem peitos. Apenas umas palavras nos separam da cidade solar onde a magia das sombras se expande polo universo.
Olhar as casas valeiras, os armários cheios de pó do passado. Olhar para os braços a diário prostituídos miseravelmente, quando desejam ser asas de libertação. Olhai, amigos, para os pés sujeitos à terra erma, raízes apegadas ao fracasso. Nem a água e nem o sol podem criar a beleza vital. Só o vento, que expande a semente da paixão.
E se a viagem para o poema tem a incerteza duma aventura astral, abandonando o odor das pessoas e o fume oblíquo das vozes. Toda viagem sem retorno, atirando as máscaras, é ainda mais cruel. É o medo ante o espelho, não suportar a face branca com os traços difusos do outro, perdendo já a absurda identidade nesta sociedade burguesa, o apelido que implica a possessão: o dom caracterizador do homem mais absurdo, e que polo contrário lhe resta humanidade. Assim nasceu o assassínio.
Çopyright 14:
Poemas,
Pedro Diniz de Sousa
Çopyright 16:
Trainspotting (O cumprimento da profecia),
Pedro-Milhám Casteleiro